Intensa, beirando o exagero. Feliz e sonhadora na mesma proporção. Libriana,o que explica muito disso.
Aspirante a poeta desde sempre, administradora de empresas desde 2002, compositora desde a boa vontade de Marco Vilane e produtora para conciliar admistração e arte.
Filha, irmã, tia, sobrinha, amiga, dançarina de coreografias estranhas, incessante na busca do amor e da compreensão do outro. Cantora para os azulejos da sala de banho.
Sincera sempre. Ácida e violenta apenas por necessidade.
Boêmia que não aprecia álcool. Ébria desde o nascimento.
Curiosa sobre os sentimentos e a vida ao redor. Responsável por isso também!
Uma mulher que apesar das dúvidas sabe bem onde quer estar: Aconchegada entre poesia e música.
O toque da campainha no entardecer da noite de hoje me fez sentir viva. Meu pai me olhou desconfiado de quem poderia ser. Eu, na minha prece mais íntima,apenas aguardava. As palmas ouvidas segundos antes, trouxeram excitação.
Dim Dom.
Corri com mais ansiedade que a delas para pegar os bombons que acidentalmente existiam na cozinha para comungar da poesia da globalização.
Quatro vozes femininas.
As vejo sair sorridentes e agradecidas com o sacolinha de mercado rala. Retorno com o pote quase vazio após quase um minuto de êxtase.
Elas nem imaginam que hoje, coincidentemente hoje, é um dia histórico da voz feminina. Por vezes graves. Mas hoje, essencialmente femininas.
Itaquera é longe feito as voltas no quarteirão que eu corria nas aulas de educação física na quinta série. Coisa mais desnecessária. Mas se eu vou em Itaquera às vezes, é porque algo me interessa. Fato! Fora meus interesses, outras coisas trago.
Eu poderia ter optado pelo trem. Mas neste dia escolhi ônibus e metrô. E também escolhi ao descer a escada rolante, dobrar à direita. Tudo fugindo aos meus inconscientes princípios. Eu sempre achei que trem tem mais poesia a me oferecer do que o metrô e que o lado esquerdo apresenta cenas mais interessantes que o direito. Minhas bobagens!
Embarquei no metrô e lembrei de novo da minha professora dizendo que era incoerente embarcar em qualquer coisa que não fosse barco. Quando não estou no meu carro, costumo pensar e lembrar mais. Da Corinthians-Itaquera ao Belém são nove estações. E foi em Artur Alvim que a poesia se revelou.
Uma moça de cabelos negros, relativamente curtos entrou no vagão e se acomodou de pé perto da porta, onde eu podia a observar de frente.
O metrô começou a andar e no mesmo momento, a moça fez sinais surdos-mudos. A princípio, pensei que ela estivesse se comunicando com alguns amigos, mas ela estava sozinha. Não dei muita importância.
Na próxima parada, a cena se repetiu exatamente no mesmo momento de partida do trem. Aquilo, despertou a minha curiosidade.
Em toda partida ela coreografava os seus sinais surdos-mudos absolutamente sozinha. Os mesmos sinais. Durante mais duas estações eu tentei entender o que ela queria dizer. Mas era tão bonito que eu descartei a mensagem e comecei a supor. Sabe aquelas pessoas que cantam e dançam sozinhas pela rua? Pois é! Tive a certeza de ter a sorte de encontrar uma pessoa surda-muda que cantava e dançava sozinha pela rua. Depois, procurei câmeras pelo vagão. Poderia ser alguma cena de um curta ou de um longa mesmo. Era tão sensível! Não achei câmera alguma e resolvi apelar ao olhar incisivo.
Encarei de maneira que a mim seria incômoda, demonstrando em meu olhar toda a curiosidade e respeito ao diferente. Ela nem se abalou. O que mudou é que ela coreografava agora me fitando. A mesma dança! Sou capaz de repetir os movimentos que pude assistir por sete estações. Não havia dúvida que ela era feliz. Que o fato de não falar e não ouvir não a impedia de escutar a música da metrópole e cantar em seus gestos. E não havia dúvida que ela me encheu de vida voltando de Itaquera. Eu ia descer no Belém e já tinha ensaiado parte da dança pra retribuir a ela um pouco do encanto. Mas ela desceu na mesma estação.
E eu retardei meus passos me fingindo de perdida na estação, apenas para ficar atrás observando um pouco mais. Ela continuou a dança pela escada rolante. E eu logo atrás sorrindo discreto. Caminhando lentamente é claro, porque poesia assim de métrica perfeita é raro encontrar.
Logo ela acenou para um rapaz que estava à sua espera. Trocaram afagos , beijos e palavras para meu espanto. Eu não podia ficar parada e esbocei ir à bilheteria só para tentar entender o mistério. Não tinha mais como postergar ficar ali observando o casal. Estava sendo mais constrangedor pra mim do que pra eles. Comecei a andar devagar e olhar para trás. Eles caminhavam para o mesmo lado que eu. Ela não dançava mais. Desci a escada rolante e parei em qualquer camelô para que eles tomassem a frente novamente. Ela não dançava mais.
Eu tinha que virar à esquerda. Eles seguiram no rumo contrário do meu inconsciente. Por um instante pensei em correr , questionar, esclarecer, agradecer... Mas era muito verbo!
Sob olhos curiosos, executei na esquina um trecho da dança que aprendi. Ela não olhou pra trás. Ela não ouviu o quanto eu a amei.
Não raramente , ouço uma canção e são meus olhos que aplaudem com lágrimas. Nem sempre a boca é capaz de expressar as emoções. Aliás, eu acho mesmo que boca só expressa emoção não tão emocionante.
Eu quando ouço canções, choro. Não cabe em mim tanta beleza e é preciso derramar.
Não posso permitir que as pessoas que eu amo evaporem ilesas de acordes casados com determinadas palavras na voz de determinados intérpretes. É a poesia da comunhão. Quem não acredita em Deus, tenho certeza que com certas canções abrem-se à beleza da dúvida.
Depois de passado o êxtase da beleza eu continuo o pranto. Agora egoísta, é verdade.
Tenho consciência de que também irei.E neste dia restarão muitas canções ainda desconhecidas . Canções que me doem desde hoje a hipótese de não conhecer. E quantos serão os compositores e intérpretes que ainda nem nasceram e que não poderei esperar.
Eu que me vejo um pedacinho de Deus, antecipo minhas preces suplicando que eu seja o Seu ouvido. Mas há ressalvas. Quero ser o ouvido esquerdo, aquele que ouvirá as canções que ainda não existem.
Ele que é Deus e paciente que seja o ouvido direito para suportar tanta palavra impensada de seus filhos.
Eu sou humana. Sou egoísta. E só pretendo ser o ouvido esquerdo de Deus.
Sabia amor que um cajueiro demora até cinco anos para dar frutos?
Eu esperei. Não que tenha esperado com afinco. Eu joguei a semente na terra e reguei por muito tempo aguardando um sinal, mas eu não conseguia observar as raízes se espreguiçando na terra.
Meu cajueiro tornou-se uma lembrança cada vez mais distante. Raramente eu olhava o frágil caule quase desfolhado . Confesso que sempre confiei na chuva.
Existem outras árvores na vida, meu amor! E quando eu sentia tédio eu esparramava sementes pra me distrair.
Nem tudo vingou no meu pomar. Algumas deram poucos frutos que logo apodreciam e não era viável investir tempo e amor em cultivá-las. Outras, apesar dos bons frutos, morrem cedo. E a gente chora feito Zezé lastimando seu pé de laranja lima.
E de caju em caju eu lembrava do meu cajueiro. E foi um dia triste quando constatei que não sabia mais onde eu havia deixado as raízes dele. E por mais que eu percorresse meu quintal eu não conseguia lembrar e nem encontrar vestígios. Eu não conhecia um pé de caju.
Eu esperava os julhos com esperança em ver algum esboço de castanhas. Mas não havia.
Nem todos os cajueiros são iguais. Do meu cajueiro muitos querem saber. Eu conto apenas pra quem possa acreditar que um cajueiro pode frutificar depois de vinte anos, no outono e inexplicavelmente na minha cama.
Veja se já é futuro. Se os lírios da possibilidade já se abriram. Olhe pela janela!
Porque minha sobrancelha já está delineada pra você enxergar beleza ao abrir os olhos.
Se já for futuro, eu preciso que você saiba do feitiço que descansa em minha tatuagem.
E preciso ainda que você saiba que eu não temo baratas e lagartixas, mas que eu vou fingir pânico apenas pra me aconchegar em seu peito.
Porque se for futuro, eu tenho que providenciar um lugar só nosso. Talvez uma cidade que se paralise com nosso beijo, só pelo gosto breve da eternidade.
Porque se for futuro, eu posso te emprestar minhas asas ou minha insanidade em tecer vínculos.
Não sei se já é futuro do outro lado da rua. Mas eu vejo todo dia o seu olho na fresta. Só precisa ter coragem de abrir a janela, Amor!